Luizinho Calixto: de picotador de peça à mestre da sanfona de oito baixos

Campina Grande, 17 de junho de 2016  ·  Escrito por Patrícia Nascimento

No dia 21 de junho de 1956, no bairro do Monte Castelo, a cidade de Campina Grande, ganhava de Dona Maria Tavares Calixto e de João de Deus Calixto um dos seus mais nobres filhos: Luiz Gonzaga Tavares Calixto, ou simplesmente Luizinho Calixto. O caçula da família veio para mostrar não somente à Paraíba, mas a uma boa parte do mundo, que o filho de pessoas humildes pode conquistar os mais importantes espaços, basta tão somente força de vontade e amor pelo que faz.

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Luizinho também toca outros tipos de sanfona, mas seu amor mesmo é a de 8 baixos

Luizinho Calixto é tocador de fole de Oito baixos, sanfoneiro, compositor, cantor, desenhista, artista plástico, professor e inventor do manual de como tocar sanfona de oito baixos; um método criado por ele, quando no meio de uma aula teve a ideia de copiar o teclado do instrumento abrindo numa cor e fechando noutra, fazendo uso de uma caneta preta e uma vermelha. Segundo o próprio Luizinho: “um sistema infalível”, porque até então ninguém tinha feito nada do tipo que pudesse ajudar na aprendizagem deste instrumento tão difícil de tocar.

Filho de um tocador de fole de oito baixos e irmão de sanfoneiros, a música mais parece está no sangue.  Aos sete anos ouvia os programas do Rosil Cavalcanti do rádio da casa do vizinho, pois, seus pais não tinham condições financeiras para ter um aparelho em casa. Ouvido atento gravava algumas músicas na cabeça, e no dia seguinte, tomava o assento da cadeira e começava a mexer simulando uma sanfona e assoviando a música que tinha escutado na noite anterior: “foi assim que a música entrou na minha vida”, afirma o mestre Luizinho.

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Zé Calixto, irmão mais velho de Luizinho é também uma de suas referências

O sanfoneiro sempre foi muito apegado à mãe, cuja musicalidade era pouca, mas desde cedo intuía que Luizinho seria um grande tocador, tanto que pediu ao filho Zé Calixto que trouxesse uma sanfona do Rio de Janeiro para o caçula. Em atenção ao pedido da mãe, ao completar nove anos Luizinho ganha, do irmão sua primeira sanfona de oito baixos. O garoto começa a tocar de imediato, como se já tivesse feito aquilo antes: “com toda certeza uma coisa divina, porque não tem explicação pra isso”, recorda emocionado, o artista.

O talento de Luizinho era notório de forma a despertar o interesse de Rosil Cavalcanti, amigo de Zé Calixto, que foi à casa de Seu João pedir para o garoto se apresentar no seu programa. Luizinho lembra que os pais relutaram por ele ser o mais novo dos filhos, mas afirma que sabia se comportar: “nunca fui uma criança levada, era criado num regime muito seguro” enfatiza.

Rosil conseguiu levar o mais novo tocador de oito baixos da cidade para o programa e a partir deste episódio Luizinho tinha certeza do que queria para sua vida. O sanfoneiro conta que mais tarde foi para o Rio de Janeiro acompanhando a mãe à passeio – o menino servia de guia para a genitora que não sabia ler. Aos dez anos começou a trabalhar como picotador de peças (auxiliar de sapateiro) para ajudar nas despesas da casa, mas Dona Maria não queria que o filho deixasse de estudar e o matriculou em duas escolas ao mesmo tempo: no Grupo Santo Antônio – da qual era zeladora, e na Escola Assis Chateaubriand, no bairro Zé Pinheiro, em ambas, Luizinho estudava a mesma série; uma pela manhã e na outra à tarde.

Assim que o bairro Jardim Paulistano foi inaugurado, a família Calixto se mudou para lá. Como a distância entre o bairro e Colégio Santo Antônio era grande, a irmã, que trabalhava em um consultório no Centro, pagava o transporte de volta de Luizinho e a mãe. O caçula da família ainda recorda com tristeza, a morte da irmã falecida aos 73 anos, vítima de atropelamento.

Como o moço além de tocar fole de Oito baixos, tinha grandes habilidades com desenho, resolveu trabalhar no ateliê de foto-pinturas de José Marques, amigo de infância. E mais tarde com Mário Ourix de Olivera, na Rua Rui Barbosa, também desenhando. Nessa mesma época, Luizinho estudava à noite na Assistência Social Santa Terezinha e morava no Alto Branco. Com a carga de trabalho grande, havia noites de não poder ir em casa tomar banho e então do ateliê ia direto para a escola. Chegou o momento de Luizinho escolher entre a escola e o trabalho, mas por ser filho de pobre não podia se dar ao luxo de apenas estudar.

Tempo mais tarde Luizinho foi para o Rio de Janeiro no intuito de dar continuidade ao trabalho de desenho fotográfico, não desconfiava que o fole dos oito baixos o fisgaria definitivamente. Zé Matias, um conhecido da cidade de Aroeiras o contratou para tocar num Club aos fins de semana, e então, a musicalidade semeada na infância começou de novo à aflorar. Seduzido pelas noites e festas do Rio não demorou para adaptar-se. Luizinho conta que fez muitas amizades e não demorou para gravar seu primeiro disco no final de 1975, intitulado “Vamos dançar forró”, lançado no ano seguinte.

Durante os cinco anos no Rio, fez amizades com Dominguinhos, Jackson do Pandeiro, Nara Leão, Vital Farias. Apresentou-se no Teatro João Caetano com grandes nomes da Globo. Foi convidado por Dominguinhos para tocar no Teatro da galeria num show com Nara Leão. Gravou ainda o segundo disco, mas desencantou-se com o Rio, e, a saudade dos pais, já idosos, o fizeram regressar ao Nordeste.

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Ao todo Luizinho já tem…CDs gravados e se prepara para lançar o…

Resolveu morar em Fortaleza, seu amigo Messias Holanda o convidou para conhecer e tocar na sua casa de shows, localizada na Praia do Futuro, Luizinho se encantou pelo lugar e voltava para Campina a cada 15 dias. Em Fortaleza conheceu e fez amizade com Fagner, Ednardo, Belchior, afinal de contas, Luizinho era o único sanfoneiro que tocava chorinho. O artista diz que a convivência com esses cantores e seus estilos foi o que o motivou a aprender tocar outros estilos, inclusive bolero. E assim o paraibano arrancou elogios do compositor, Edvaldo Gouveia, que foi cumprimentar Luizinho, encantado porque nunca tinha ouvido sua música ser tocada por uma sanfona de oito baixos.

Edvaldo Gouveia o convidou para se apresentar com ele no Teatro José de Alencar, na ocasião conheceu o secretário de cultura de Fortaleza que o chamou para se apresentar na Europa. Casado com uma amazonense – que não sabia dançar forró – destaca Luizinho, pai de Thiago e Larissa, se apresentou em Paris e Portugal, em 28 dias pela Europa, divulgando Fortaleza e o Ceará. A partir daí, já fez oito viagens à Europa em países como Portugal, Espanha e França, além da Argentina e também na África, em Cabo Verde, à convite da Baixada do Brasil, levando um pouco da cultura nordestina para o mundo.

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Luizinho, sempre bem humorado, não larga sua sanfona de 8 baixos.

Dono de um carisma único, Luizinho também fez amizade com Rangel Junior, com quem gravou três músicas. Rangel, atual Reitor da Universidade Estadual da Paraíba, pensando na difusão e fortalecimento da cultura e conhecendo o trabalho de Luizinho Calixto lhe propôs que ministrasse aula de sanfona de oito baixos para alunos da UEPB, no Centro de Arte e Cultura. O sanfoneiro diz que aceitou sem pensar no tamanho da responsabilidade. Para ele o desafio era enorme uma vez que “não existia método, nunca houve escola, nem professor de sanfona de oito baixos”, enfatiza.

Luizinho foi para A casa do Carnaval, em Recife, onde passou uma semana dando oficina de oito baixos. Ele conta que resultado foi satisfatório e acabaram o contratado por mais um mês, foi nesta época que Luizinho Calixto, filho do Sanfoneiro João de Deus e Dona Maria, criou o primeiro e depois o segundo manual de sanfona de oito baixos. Tal manual foi elogiado por Dominguinhos e tem sido difundido em quase todos os Estados do Brasil e em muitos países da Europa. Vale lembrar que o oito baixos é um dos instrumentos mais difíceis de se tocar no mundo. Existem 11 afinações diferentes deste instrumento e a afinação que Luizinho toca é a mais difícil.

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Luizinho foi o primeiro e único musico a conseguir desenvolver uma escala para sanfona de 8 baixos

O mestre lembra que músicos do Rio Grande do Sul querem aprender a tocar na sua afinação e o manual tem ajudado: “Eles me pedem e eu mando pelos Correios e eles estão aprendendo, já estão me perguntando o que podem tocar e eu estou dando dica do que seja mais fácil ou menos complicado”, e continua: “com isso, graças a Deus, eu estou conseguindo alcançar a meta, que é tirar os sanfoneiros de oito baixos do ostracismo e acabar com a ideia de que o instrumento no futuro serviria só pra enfeitar prateleira de bacana, graças a Deus, nós estamos conseguindo acabar com isso”.

O mestre sanfoneiro, Luizinho Calixto tem alunos de sanfona de oito baixos no interior de Pernambuco, Ceará, Alagoas, Rio Grande do Norte, Bahia, com os quais se comunica através de e-mail, telefone ou quando vai fazer oficinas e shows nessas regiões. Muitos desses alunos vieram, revela Luizinho, atraídos pela possibilidade de aprender através do manual.

Luizinho faz questão de demostrar a alegria de contribuir com a aprendizagem do instrumento tão desejado, e conta como é satisfatório o trabalho que hoje realiza: “Minha vida tá um tanto atribulada depois que eu criei o manual pra tocar sanfona de oito baixos. Cansado eu não estou porque é uma coisa que me dá muito prazer, muita alegria, faço novas amizades. Os meus alunos têm o maior respeito, o maior carinho e tenho uma amizade por ele e eles por mim, é muito gratificante, me deixa muito feliz”.

O mestre ganhou de Luiz Gonzaga a sanfona do seu último show, essa se encontra no museu em Recife e é de propriedade de Luizinho; ganhou da Scandalli, famosa fábrica Italiana de Sanfona um fole de oito baixos fabricado exclusivamente pra ele, essa empresa não fabrica tal instrumento. Em toda sua carreira musical gravou oito disco de vinil e onze Cd’s. Dono de um riquíssimo acervo musical, hoje é tido como um dos melhores do Brasil no que diz respeito ao fole de oito baixos.

 

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“Gente Nossa” apresenta: Luizinho Calixto

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