Grupos no Whatsapp tornam-se importantes para manter viva a poesia popular

Campina Grande, 18 de junho de 2017  ·  Escrito por Emanuelle Carvalho e Maryanne Paulino  ·  Editado por Valtyennya Pires  ·  Fotos de Divulgação/Rádio Cidade
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Poetas Eloi Davi, Jéssica Gomes, Neto Ferreira e Jefferson Felipe. (Foto/divulgação: Rádio Cidade)

Não há dúvidas que as redes sociais têm modificado o modo como nos comunicamos uns com os outros. Além da possibilidade dos usuários terem acesso a qualquer conteúdo ou assunto com uma rapidez nunca vista antes, agora eles também podem expressar suas opiniões, compartilhar gostos e interesses, e se conectar em tempo real com pessoas em diferentes localidades. Outra funcionalidade desses espaços vem chamando atenção no Cariri da Paraíba e no Pajeú pernambucano. Poetas dessas regiões e do Brasil inteiro têm se reunido em grupos no app Whatsapp com o intuito de manter viva a cultura da poesia popular.

Ao contrário do que se pensa, a tecnologia e, especificamente, as redes sociais, não estão acabando ou relegando a um segundo plano a poesia popular. Há, na verdade, uma colaboração positiva, pois se percebe que através destes grupos há uma manutenção dessa cultura, conquistando muitos jovens. Para Jefferson Felipe, poeta, criador e participante de grupos sobre poesia popular nordestina, as redes sociais têm adquirido um papel muito importante, pois elas contribuem muito para que os jovens vejam o que é a poesia, a admirem e comecem a produzi-la. “Estamos descobrindo uma série de novos poetas com uma faixa etária entre 15 e 30 anos, uma nova geração que surge desses grupos, desses momentos que a internet propicia pra gente”, conta.

A possibilidade de contato direto com grandes nomes da poesia por meio desses grupos, cria não somente um público fiel como também desperta o interesse de pessoas que nunca leram poesia: depois que integram-se ao grupo começam a rabiscar, a compor alguns versos. E assim se mantém a poesia popular: além da disseminação e maior repercussão nas redes sociais de poesias já renomadas, também vão surgindo novos versos e novos poetas que igualmente colaboram nesse processo de valorização e preservação da cultura popular. “Eu vejo como algo de grande importância, muita gente não sabia escrever considerando as métricas e a estrutura da poesia popular e foram incentivados por outros poetas no grupo a iniciarem nos versos, e hoje até declamam enviando áudio aos grupos. E de certa forma é uma possibilidade de inserir a poesia com a tecnologia. É um ganho enorme para a poesia”, exalta Jefferson.

Mote: Dudu Morais (Tabira-PE)

“Ou você se decide em sua vida

ou me deixe tentar seguir em paz”

Poesia: Tamiris Martins (PE)

“Implorar o seu amor, eu já cansei,

não dá mais pra viver me humilhando,

veja bem o tempo está passando

e eu perdendo pelo tempo que lutei,

Você não quis o amor que eu te dei

pra você tanto fez, pra mim tanto faz

saiba bem não vou mais correr atrás

sinto muito mas estou bem decidida

Ou você se decide em sua vida

ou me deixe tentar seguir em paz”

Essa prática de reunir nas mídias sociais poetas, declamadores e admiradores de poesia de todo o país tem se tornado cada vez mais comum. E repercute tanto que viraliza em outras redes sociais, como é o caso de sucesso do grupo “Poetizando a Rotina”, idealizado e criado pela poetisa Mariane Alves (Triunfo-PE), que hoje conta com uma fanpage no Facebook com mais de 95 mil curtidas. O grupo surgiu no Whatsapp pouco tempo depois que o App foi criado e passado alguns meses conseguiram realizar o primeiro Sarau de Poesia em Recife (PE). “Isso foi interessante porque conseguimos juntar pessoas do Brasil inteiro, que passamos a conhecer por meio do grupo do Whatsapp, pra ir à Recife.” De um grupo de 90 a 100 mil pessoas,  resumiram em 25 pessoas num grupo de Whatsapp (limite da rede social na época) nas quais 15 confirmaram a ida ao Sarau, pessoas de vários estados: Curitiba, Minas, São Paulo, e então alugaram um apartamento e dividiram as despesas. Jefferson nos revela que até então todos eles ainda não se conheciam pessoalmente. “A poesia tem um elo muito forte!”, enfatiza ao falar do empenho coletivo para a realização do primeiro evento poético.

Tamborete do Cariri

Um exemplo de grupo no Whatsapp sobre poesia popular é o Tamborete do Cariri. Sua história é ainda mais interessante porque transcendeu as redes sociais e foi parar numa emissora de rádio, fazendo o caminho inverso do que é comum atualmente, alcançando ainda mais pessoas.

O grupo foi criado em setembro de 2015 no Whatsapp, por Jefferson Felipe, natural de Sumé, no Cariri paraibano, com a ideia de reunir amigos que admiravam e/ou faziam poesia popular. Desde sua criação até hoje, pessoas da Paraíba e do Pajeú pernambucano compõem a maior parte do grupo, mas há gente de todo o Brasil contribuindo e apreciando as poesias nordestinas. Para que as poesias surjam, alguém sugere um mote e/ou tema no Whatsapp e a interação vai acontecendo, vão ‘versejando’ em cima, ou fazendo desafios a partir do tema sugerido que em sua maioria são sobre o sertão, o cariri, o amor pela terra, o amor não correspondido.

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As poesias também são criadas diretamente no aplicativo de relacionamento

Na época da criação do Tamborete do Cariri, Jefferson Felipe era Diretor de Cultura de Sumé e propôs a inserção de poesia no cotidiano dos sumeenses através de um programa de rádio. “Foi a melhor forma que achamos. Todo departamento tem um valor fixo mensal para divulgações e intervenções na rádio. Eu pedi que fosse tirado esse tempo que eu tinha pra colocar o programa de rádio”, contou. Curiosamente, a radialista Jacquelline Oliveira, da 95 FM, “já estava de olho no grupo”. “A gente acompanhava os meninos fazendo poesia nos lugares, na universidade mesmo eu sempre via, porque eu estudava lá, e eu achava bonito demais, mas com pouca divulgação. Se tivesse mais, teríamos mais poetas por aqui”, disse Jacquelline. E foi então que, na transição da AM para FM, ela e os demais radialistas da 95 FM arriscaram inserir um programa sobre poesia na nova grade. O Tamborete do Cariri deixou de ser apenas um grupo no Whatsapp e passou a ser também um programa de rádio. No início era trinta minutos de poesia diariamente, lidas pela radialista ou declamadas pelos próprios poetas.

No entanto, com o passar do tempo e o surgimento de dificuldades de edição dos áudios de forma rápida para irem ao ar, o programa tornou-se semanal, ao sábados, em horário nobre, das 12h30min às 13h. “O  povo gosta demais. O ponto mais alto eu acho que é a poesia que fala de amor, de sofrimento”, afirma entre risos.

O grupo deu tão certo que até hoje está ativo, bem como o programa na rádio. São pessoas de todos os lugares e de todas as idades, pessoas que não sabem usar o Whatsapp mas pedem para um neto, um amigo o ajudar, para que ela também colabore com suas poesias. Além disso, declamações ao vivo no estúdio são frequentes e o grupo já realizou um sarau poético em comemoração ao seu primeiro ano de existência. “A poesia se faz necessária no nosso cotidiano. Como diz o nome do grupo de Mari, é necessário poetizar nossa rotina. No momento em que a gente consegue inserir poesia no nosso dia a dia, com ajuda do Whatsapp, por exemplo, junto dela tem uma carga de respeito e amor pela nossa cultura popular, de sentimentos bons”, diz Jefferson Felipe.

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