A tradição dos festejos juninos nas comunidades continua, claro que não com a mesma intensidade de épocas atrás, mas os populares que residem nas periferias seguem preservando suas raízes com muita criatividade. É o que se pode ver, por exemplo, no bairro de Bodocongó.
Entre o antigo matadouro de Campina Grande e o novo polo calçadista da cidade, contando com uma igreja evangélica, uma esquadraria, dois mercadinhos, uma mercearia, um bar e ainda um curtume, está uma das vias mais famosas do bairro, a Rua Professor João Rodrigues, conhecida por todos como a “Rua do Meio”. É lá onde se realiza a principal comemoração de São João da comunidade, a extrovertida quadrilha “As Virgens da Rua do Meio”.
Tudo começou muito tempo atrás, em uma rua paralela por volta da década de 80, como contou a aposentada Amélia Rodrigues. “Meus meninos subiam lá, onde todo mundo se juntava para dançar quadrilha”, relembrou a moradora da Rua do Meio. Dona Amélia é mãe de um dos antigos organizadores da comemoração, mas hoje não gosta de falar do assunto. Seu filho foi morto durante a festa. Por isso, a quadrilha deixou de ser realizada por cerca de dezessete anos.
Apesar do fato, a festa não acabou. Em 2002, alguns moradores decidiram retomar “As Virgens da Rua do Meio”, mesmo que não mais na mesma rua. Com características diferenciadas das tradicionais quadrilhas juninas, esta se apresenta próximo ao dia cinco de julho, quando na maioria das vezes já tem chegando ao fim a festa no Parque do Povo, mas essa não é apenas uma estratégia para evitar a grande concorrência, conforme revelou a jovem Ana Maria de Almeida, 23. “Desde o início, quem organiza a festa utiliza os restos da decoração do Parque do Povo para enfeitar a nossa rua. Algumas pessoas se reúnem e vão até lá no dia seguinte ao fim do São João e recolhem o que dá para ser reaproveitado aqui”, contou Ana.
Outro fator que diferencia o festejo nesta localidade é a vestimenta dos participantes. Os homens utilizam saias e vestidos rodados, enquanto as mulheres põem calças decoradas e se pintam com barbas e cavanhaque, como costuma se fazer durante o carnaval. A descontração é a marca registrada do pessoal que dança nesta quadrilha. Antes dos adultos, as crianças também têm o seu espaço no arraial.
Mais uma característica desta quadrilha atípica é o fato de que, diferentemente das demais, os integrantes não realizam ensaio. Tudo é no improviso. Ana Maria já dançou cinco vezes na festa e destacou, “nunca temos ensaio, é tudo em cima da hora. Acho que isso deixa tudo ainda mais divertido”. A jovem ainda ressaltou que não acontecem comemorações juninas em outros locais em Bodocongó, e isso acaba atraindo pessoas das proximidades e até de outros bairros para a Rua do Meio. Quadrilhas e pequenas bandas de forró da cidade também se apresentam durante o festejo.
Para a realização do evento, os moradores não contam com nenhum incentivo do poder público ou de grandes empresas. Alguns donos de comércios locais contribuem como podem, mas na maioria das vezes a maior fonte de patrocínio é o dinheiro arrecadado através da venda de rifas. “É um dos únicos momentos em que a comunidade trabalha junto. A maioria dos moradores aqui ajuda”, destacou Ana.
Para esse ano, como de costume, ainda não começaram os preparativos para os festejos juninos. “Tenho certeza que a comunidade não vai deixar essa tradição morrer”, completou a ex-integrante da quadrilha.
Fotos: Luiz Eduardo Soares e Aluska Mikaella
Edição: Joaresa de Mendonça