ESPECIAL|Artesanato, um protagonista nas histórias de São João

Campina Grande, 26 de junho de 2018  ·  Escrito por Bruna Martins, Larissa Santos e Pâmela Vital  ·  Editado por Inaldete Almeida  ·  Fotos de Larissa Santos e Pâmela Vital

Artesanato  paraibano atrai turistas de todo  o país  no período junino

Passado muitas vezes de geração em geração, o ofício do artesanato em qualquer cultura traduz a identidade do lugar. O valor simbólico presente nesses objetos vai além da sua estética e beleza; compõem a preservação de suas tradições.

Turistas visitando os produtos de couro do Chalé 51 de João Batista

Turistas visitando os produtos de couro do Chalé 51 de João Batista

Quem nunca viajou para Maceió e comprou itens feito de renda? Ou foi para Bahia e trouxe bonecas de barro para decorar a sua casa? Quem sabe até mais perto, em Porto de Galinhas, e trouxe para seu lar uma galinha pintada, referência da cultura local?! Pois é, em Campina, durante o Maior São João do Mundo, não é diferente.

Um dos pontos turísticos mais frequentados pelos que estão visitando a cidade é o mercado de artesanato. No período junino da Rainha da Borborema, a presença maciça de produtos feitos manualmente por artesãos de toda a Paraíba, pode ser vista em seu auge por vários estabelecimentos públicos e privados da cidade.

Além de conhecer um pouco da história e dançar o autêntico forró pé-de-serra, o turista pode ainda levar um pedaço de Campina para seu lar ou ainda, é claro, escolher peças de argila, madeira, barro, metal, fibra, algodão colorido ou até comidas típicas para presentear seus familiares que não puderam comparecer à festa.

 

 

Vila do artesão

O projeto da Vila do Artesão foi idealizado pelo então prefeito de Campina Grande, Veneziano Vital do Rêgo Neto, e inaugurado no ano de 2010. Com o objetivo de legalizar o comércio de artesãos que não tinham ponto fixo na cidade, assim como preservar o artesanato local, o espaço foi desenvolvido em um terreno próprio, para que os produtos feitos pelos campinenses fossem expostos nos 365 dias do ano.

Para selecionar os artesãos que iriam trabalhar no local, abriu-se um período de inscrição, e logo em seguida, foi realizado um sorteio especificando as lojas para cada um dos 120 inscritos comercializarem seus artigos.Um dos pré-requisitos pedidos no ato da inscrição, foi que o artesão residisse em Campina Grande. Como contrapartida pelo local, cada beneficiário paga uma taxa de manutenção pela Vila, restando a energia como responsabilidade de cada loja.

Andrezza de Souza, 23, administradora da loja Via Terra, trabalha produzindo peças de algodão colorido há 10 anos com sua família. Eles estão na Vila desde a sua fundação e contou que antes não tinham um ponto fixo. 

Carro chefe da Via Terra - sandálias de algodão colorido feito manualmente.

Carro chefe da Via Terra – sandálias de algodão colorido feito manualmente.

Na loja, Andrezza produz a parte de acessórios como bolsa, tiara, brinco, tudo no algodão, enquanto o resto de sua família trabalha com peças para decoração, vestuário, calçados e redes. Segundo ela, a matéria prima usada é toda  adquirida em Campina Grande com produtores locais, justamente para fomentar o comércio da região. Ela confirma que essa época é, sem dúvidas, a melhor do ano e que, durante o período junino conseguem abastecer o caixa para os meses que tem pouco fluxo de pessoas: “Durante o período festivo, os turistas aparecem e vendemos mais, ao contrário do resto do ano quando o comércio é bem menor. Infelizmente, o pessoal de Campina Grande não compra artesanato. Se eles desejam presentear alguém, vão ao shopping comprar o presente ao invés de vir a Vila escolher uma peça que foi feita aqui”, desabafou a artesã. 

 

Outro comerciante que encontramos na Vila é o João Batista, um senhor muito engraçado que recebeu a equipe com muita alegria em sua loja, Chalé 51, e ainda fez um trocadilho com o slogan de uma cachaça famosa, “é uma boa ideia”, ao falar de seu comércio. Seu João trabalha há 30 anos com artesanato de couro, na produção manual de bonés, chaveiros, sandálias, porta-cachaça, porta-cartões, bolsas e quadros. Até nome de artista ele tem assinando em várias de suas obras: D’Jango, como sua filha o apelidou pela abreviação de seu nome. 

João Batista, artesão de couro da Vila do Artesão em Campina Grande.

João Batista, artesão de couro da Vila do Artesão em Campina Grande.

Em relação às vendas, destacou que o São João da edição 2017 trouxe maior renda do que o atual,  mesmo após a semana auge de festejos juninos: “Ano passado foi melhor o movimento. Esse ano pelo o que percebi foi menor, mas acredito que nos próximos anos essa situação vai melhorar”, comenta

Nas 76 lojas da Vila do Artesão, há a divisão entre os 120 profissionais que lá expõem seus trabalhos. No chalé de Seu João, por exemplo, trabalham mais duas pessoas, cada uma com sua especialidade, que ficam, junto ao entrevistado, alternando os dias presentes no Chalé 51 para receber os clientes: “Enquanto não estou aqui, fico na minha casa fazendo meus trabalhos. Cada dúzia de bonés são quatro a cinco dias de trabalho, mas não me canso. É o que gosto e sei fazer desde quando era mais novo, e ainda hoje, não tenho previsão de abandonar”, relatou se despedindo da equipe e já partindo para mostrar seus produtos a um casal de turistas que adentrava à loja.

 

Salão do Artesanato

Outro local de visita constante de turistas no mês de junho é o Salão de Artesanato, idealizado pelo Governo do Estado. Na sua 28ª edição, está localizado na Av. Brasília, ponto central de Campina Grande e traz para a população trabalhos de mais de trezentos artesãos de toda a Paraíba, nos setores de madeira, argila, tecido, algodão colorido, entre tantos outros que trazem como lema a valorização da cultura paraibana.

Marizete Evaristo com suas panelas, tradição familiar datada há mais de cem anos.

Marizete Evaristo com suas panelas, tradição familiar datada há mais de cem anos.

Logo na entrada, é possível se deparar com o artesanato de Marizete Evaristo, 38, cuja tradição vem sendo passada há mais de cem anos em sua família. Natural de Areia, Paraíba, seu trabalho gira em torno da confecção de panelas de barro de todos os tamanhos e formatos. “Trazemos amor em nossas panelas. Tiramos o barro debaixo da terra e cuidamos dos detalhes até que elas estejam perfeitas para aguentar qualquer fogo. Pode cozinhar moqueca de camarão, galinha de capoeira, feijoada, minha filha, que ela aguenta tudo e ainda deixa a comida mais gostosa”, falou orgulhosa. Presente há mais de cinco anos, tanto no Salão de Artesanato em João Pessoa quanto em Campina, a artesã afirma que não consegue sobreviver ainda só da venda dos produtos. Mesmo vendendo muito para restaurantes de comida regional, a família ainda utiliza a agricultura para suprir as suas necessidades durante os meses de menor comercialização.  

Para Igor Nascimento, 15, contudo, a realidade é outra. Herdando o talento de seu pai, morador de Lagoa Seca, começou no artesanato há dois anos. Seguindo a tradição familiar, eles têm como cargo chefe de vendas os personagens religiosos esculpidos em madeira.

Tradição que corre nas veias; Igor Nascimento, artesão do Salão de Artesanato em Campina Grande.

Tradição que corre nas veias; Igor Nascimento, artesão do Salão de Artesanato em Campina Grande.

 

 

“Meu pai notou que os santos saiam mais, então apostou em se especializar na produção deles. Com o tempo, acabei aprendendo e hoje em cinco minutos, consigo esculpir uma peça. Claro que pintar é outra história, mas tenho duas horas diárias, depois da escola, para trabalhar nelas o quanto quiser”, relatou.

Sejam tão finas quanto gravetos ou mais largas posicionando-as de perfil, as esculturas trazem traços realistas para aqueles que buscam um diferencial nas lembranças para os parentes. Os valores das obras variam de cinco a quinhentos reais, a depender do tamanho, e é por meio das vendas que provêm a renda da família.  

 

Lúcia Lino e Edileuza Dias, artesãs que mantêm viva as bruxinhas de pano no Salão de Artesanato.

Lúcia Lino e Edileuza Dias, artesãs que mantêm viva as bruxinhas de pano no Salão de Artesanato.

Em uma das curvas do caminho que leva à praça de alimentação, a equipe encontrou Lúcia Lino e Edileuza Dias, duas artesãs de Remígio que aprenderam o ofício de produção das tradicionais bruxinhas de pano na Associação Brinquedo Popular, de João Pessoa. Em seu terceiro ano no salão de Campina Grande, as artesãs afirmam que cada boneca, desde o corte até a finalização, leva duas a três horas de confecção e que, mesmo não vendendo da maneira que esperavam, não se arrependem de participarem do evento do dia 12 ao dia 30 de junho. “Esperamos que o movimento melhore porque nosso produto representa a nossa região e deve ser valorizado, se não pelos paraibanos, pelos turistas”, comentaram. 

 

Turistas

A turista pernambucana, Lucineide de Amorim, 54, visitante assídua do São João de Campina Grande há oito anos, não se cansa de festejar o período junino na cidade. “O que adoro é o Parque do Povo. Em comparação a Porto de Galinhas de onde eu venho, aqui é bem mais organizado. Lá, no máximo temos umas palhocinhas e aqui tem forró em todos os lugares”, ressaltou.

Apaixonada por produtos regionais, Lucineide procura aproveitar suas viagens para conhecer um pouco dos produtos regionais do local. “Escolho comprar o artesanato porque gosto de prestigiar coisas bem da terra, regionais. Fiquei encantada com o algodão colorido daqui! Não é a primeira vez em Campina, mas toda vez que visito a cidade tenho alguma coisa pra levar de volta pra casa. Não consigo resistir!”, falou sorridente carregando sacolas de lojas da Vila do Artesão.

Nazaré Domingues, 63, e Carmelita Brasileiro, 66, decidiram trocar o samba  do Rio de Janeiro pelo forró pé-de-serra da capital do Maior São João do Mundo desde a última sexta, dia 22 de junho. Por indicação de uma amiga campinense, vieram pela primeira vez a Campina Grande e estão apaixonadas pela estrutura da cidade. “Não imaginávamos que o evento era tão grande. Tudo aqui é grande. O Parque do Povo é como nosso Rock’n Rio, em questão de organização. Fomos até Galante no trem do forró; super animado, aliás!”, comentou Nazaré.

Questionadas sobre o artesanato local, Carmelita se disse encantada com os artesãos do estado: “Fomos já na Vila do Artesão e estamos finalizando nossa visita aqui no Salão de Artesanato. Adorei tudo! Mas o algodão colorido e o trabalho que vocês fazem com ele aqui na Paraíba é incrível. Com certeza foi o diferencial”, enfatizou enquanto mostrava a sacola cheia de presentes para os colegas cariocas que ainda não puderam comparecer ao São João.

Caravanas de turistas de diversos estados brasileiros escolhem Campina como ponto de encontro no mês de junho. Se mesmo após conhecer um pouco mais da história local, ouvir e dançar o forró e participar de manifestações culturais como quadrilhas juninas, aqueles que não puderam visitar a Vila do Artesão ou o Salão do Artesanato,    ainda dispõe de outros locais onde podem encontrar produtos juninos. A Vila Nova da Rainha, localizada dentro do Parque do Povo, oferece uma variedade de opções de artesanato local, como rendas e quadrinhos de madeira, assim como alguns restaurantes e estabelecimentos privados da cidade, que ofertam produtos para todos os gostos durante o período junino.

Com essa gama de atrações, uma certeza permanece: “quem vem à Campina, pede pra ficar” – ou, pelo menos, promete voltar no próximo  São João.

 

 

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