Reportagem: Samya Amado
Fotografia: Gabryele Martins
Edição: Nathália Aguiar
O Teatro Municipal Severino Cabral foi palco para a celebração da cultura popular nordestina no último dia 25 de maio. A companhia de Projeções Folclóricas Raízes, que completou 29 anos de vivência popular e realiza um trabalho de pesquisa das danças populares do povo nordestino, trouxe ao público campinense o espetáculo “Dos Terreiros ao Palco”, com incentivo da Lei Paulo Gustavo. O espetáculo exalta a essência das diversas expressões do Nordeste e mostra as tantas danças que surgem a partir do dia a dia em terreiros, com famílias, vizinhos e amigos, em um cotidiano permeado por música, dança e expressões artísticas.
A apresentação começou com o xaxado, mas trouxe samba/tambor de crioula, cavalo marinho, ancestralidade, quadrilha, bumba meu boi e muitas outras danças. A cenografia e os figurinos, ricos em detalhes, trouxeram ainda mais identificação com os elementos da cultura nordestina.
“O espetáculo do Raízes foi, literalmente, um espetáculo. Tanto de beleza, quanto de informação histórica. É por meio da dança, dos figurinos, das roupas, que fica tudo mais palpável”, comentou Rafaela Albuquerque, 18, que foi ao teatro com a sua avó. “Eu acho que essa foi a parte mais legal do espetáculo: ver que ela conseguiu lembrar das coisas [porque minha avó já tem 90 anos]. Ela conseguiu lembrar das partes da nossa cultura, porque fazia parte do dia a dia dela. Ela também lembrou dos elementos que encontrou nas viagens que fez [pelo Nordeste] por meio dessas apresentações”, concluiu ela.
Caio Francisco, 17, que se juntou à companhia em 2024, é filho de uma das dançarinas da Cia Raízes e contou o motivo pelo qual decidiu participar do grupo: “Gosto da cultura, gosto da representação que o Raízes é. O Raízes não foca em apenas um único nicho e essa é a parte que eu mais gosto.”, comentou.
O espetáculo “Dos Terreiros ao Palco” apresenta ao público um lado do Nordeste que, por vezes, fica esquecido: a produção artística feita pelo povo e para o povo. Ele renova o sentimento de identidade e pertencimento. É um resgate de memória e construção de um povo seguro de quem foi e onde podem chegar com a força da própria cultura.
“Eu fui constituído a partir dessa cultura popular, né? Lembro-me ainda criança correndo atrás de bois. É uma paixão desde sempre. Tive a oportunidade de participar de grupos de dança popular e vi, nessa condição, que eu poderia me alimentar disso: me fortalecer enquanto ser nordestino. Tanto é que as nossas pesquisas, se você for olhar, ela é toda embasada nas tradições, nas expressões culturais do Nordeste”, pontuou Ronildo Cabral, 53, que é diretor da Cia Raízes.
Juliane Cássia, 37, dançarina e produtora cultural, que está no grupo há 17 anos, fala da importância de conhecer a sua identidade e demarcar o território com a cultura popular: “Hoje em dia é tão difícil a gente viver as nossas raízes. Geralmente vem de fora, a cultura de massa, como a gente chama, e se apropria das nossas crianças e da gente mesmo. A gente liga a rádio e só passa coisa de fora. Então, assim, trazer a cultura popular para o nosso povo é importante demais. E é o que nos move e faz ficar e querer lutar por essa cultura ainda hoje”, comentou.
O palco, que recebe tantos espetáculos de teatro e dança, ainda carece de iniciativas para a pluralização da sua programação e abertura do espaço para tantos grupos: “É super importante e essencial ter esse local do Teatro Municipal Severino Cabral, mas penso que é bastante importante criar esse público aqui para danças populares e outras danças que não chegam ao palco [com tanta facilidade], por exemplo, danças urbanas e esses tipos de dança que são tidas como marginalizadas”, comentou o professor e bailarino Cas Silva, 30, que faz parte do grupo de danças populares Caetés.
A Cia Raízes atraiu um público plural para o teatro e quem estava presente não se distraiu, pois cada elemento colocado no palco teve um papel quase hipnotizante: “Acredito que as pessoas saem [do teatro] mais encantadas com o Nordeste, sabe? Dizer que isso é da gente, isso é daqui… Olha quanta beleza, quanto colorido. A nossa intenção é essa: nos fortalecer, como a gente fez hoje”, disse Ronildo.
Além de dançarino e diretor da companhia, Ronildo Cabral desempenha o papel de educador da cultura e dança popular. Ele pontuou sobre a importância do grupo para a perpetuação do ensino e preservação da cultura nordestina: “É muito importante ter um grupo como o Raízes para dar esse alerta de retorno em escolas, principalmente sobre a educação. É preciso colocar mais cultura popular nas escolas. Quando é festa junina, fazem aquela quadrilhazinha e no decorrer do ano não tem mais nada, né? Quando é mês de folclore, é distorcido da forma que fazem (…) isso aqui existe, isso não é obra de ficção! Isso aqui existe e é nosso. Isso aqui é dançado nos terreiros, como é o nome do espetáculo “Dos Terreiros Ao Palco”. Eu já estou um senhor de 53 anos e ainda estou dançando porque a juventude não é alimentada [de cultura popular] e a partir do momento em que você não conhece, então você não se interessa”, concluiu.
A companhia, que chegou ao vigésimo nono ano de existência, está de portas abertas a quem se interessar pelo estudo da cultura popular. Os encontros e ensaios acontecem às quartas e sextas-feiras, às 19h, no Centro Artístico Cultural CAC – UEPB, localizado no centro de Campina Grande.