A Rede Mirante vai exibir neste domingo (7) o especial ‘Melhores Momentos do Festival de Quadrilhas’, da Rede Globo Nordeste. O programa vai ao ar logo após a série americana Revenge. O evento aconteceu no dia 29 de junho, em Cabo de Santo Agostinho (PE) e contou com a participação das quadrilhas de todos os estados do Nordeste. A grande campeã deste ano foi a quadrilha Moleka 100 Vergonha, de Campina Grande/PB. A edição faz parte da programação especial do São João do Nordeste, que é transmitido, todo ano, pelas afiliadas da Rede Globo localizadas no Nordeste do país.
No último dia 4, houve a exibição das quatro quadrilhas campeãs dos torneios regionais, municipais e estaduais. Os grupos Moleka 100 Vergonha (campeã nordestina), Cestinha de Flores (campeã do agreste), Tradição da Serra (campeã campinense) e a quadrilha junina Cambebas (vice-campeã do agreste), seja por conta dos figurinos, da animação ou até mesmo por conta da evolução, demonstraram que tanto esforço e sacrifício de um ano inteiro de trabalho valeram a pena.
A campeã nordestina Moleka 100 Vergonha dançou cenas como a morte do Carcará e o casamento da noiva Asa Branca com o noivo Sabiá. Danças estas que remetem às tradições do povo nordestino. Muitos que presenciaram as apresentações no PP talvez nem desconfiem da origem longínqua das quadrilhas juninas. Para dar uma mãozinha neste sentido, a equipe do Repórter Junino viajou até outras cidades nordestinas para fazer uma reportagem sobre esse que é um dos principais elementos simbólicos dos festejos juninos.
Histórico
As quadrilhas surgiram na França, com o nome quadrilles, por ser uma dança formada por quatro ou oitos casais formando duas filas, uma em frente à outra; originando assim um quadrado. A quadrilha chega ao Brasil, por meio da corte portuguesa, modificando os passos e movimentações em cada lugar que absorvia esta tradição.
Deste modo, a quadrilha que era um privilégio dos nobres popularizou-se com suas devidas adaptações. No nordeste, a quadrilha mesclou-se com o ritual do casamento matuto. Os casamentos eram promovidos no interior pelos coronéis, que geralmente casavam suas filhas na fazenda e convidavam as figuras mais proeminentes da região. Era obrigatória na festa matrimonial a execução da quadrilha como diversão da festa.
Com o passar do tempo, o casamento matuto, que era levado tão à sério pelos coronéis, acabou se mesclando com a diversão das quadrilhas juninas e virando brincadeira popular. Desta feita, o evento tornou-se teatralizado e cômico, incluindo as figuras do imaginário nordestino, tais como o coronel, os cangaceiros e principalmente a figura do matuto.
No final da década de 80 e começo dos anos 90, surgem as quadrilhas estilizadas. Elas se diferenciam das demais por serem uma modernização das quadrilhas tradicionais – como se pode notar no figurino, que mais se assemelha à indumentária gaúcha, com tecidos caros, e mais aparenta os adereços carnavalescos do que os trajes matutos.

Edson Almeida, coreógrafo da quadrilha estudantil Boneca de Pano.
Alguns críticos afirmam que a estilização das quadrilhas desvaloriza a cultura nordestina, uma vez que renegam a tradição dos nossos antepassados. “Está se esquecendo das raízes, da essência da quadrilha. De trazer Luiz Gonzaga, as danças tradicionais, as roupas tradicionais, essa essência da festa está sendo esquecida. Também sou fã das quadrilhas estilizadas, mas nós temos que nos recordar das nossas origens”, afirmou Edson Almeida, coreógrafo da quadrilha tradicional Boneca de Pano, da Escola Major Veneziano Vital de Rego, de Campina Grande.
No entanto, há aqueles que argumentam que a quadrilha estilizada é uma “nova dança”. Sendo assim, uma modalidade diferente da tradicional e não rival desta. Deste modo, os concursos de quadrilha se dividem em tradicional e estilizada.
Porém, pode-se perceber a desvalorização da quadrilha tradicional, a partir do momento em que a mídia massiva prioriza em suas transmissões quase que exclusivamente a divulgação das quadrilhas estilizadas. Todavia, este não é o fator preponderante para desigualdade entre as quadrilhas. O fator econômico influi em todos os processos de montagem do espetáculo junino, desde o figurino até o marcador que pode ensaiar ou não junto ao grupo. Nos grupos com um pequeno porte econômico os coreógrafos acabam por assumir mais de uma função, como o de figurinista, por exemplo.
As quadrilhas mais ricas possuem vestidos que vão de 5 a 10 mil reais. Neste espetáculo, a rainha troca de roupa três vezes e carrega consigo de 3 a 5 caminhões baús, contendo todo o material de apresentação. Tudo isto ao som de uma orquestra ao vivo.
Em contraste a essas luxuosas apresentações, muitas quadrilhas contam com a ajuda da comunidade onde vivem, precisando por vezes promover eventos tais como bingos e feijoadas para a manutenção do grupo.
Concursos
Uma das maiores motivações para o quadrilheiro, principalmente os estilizados, são os concursos de quadrilha junina. Pode-se assistir a grandes espetáculos com roupas luxuosas e brilhantes das quadrilhas estilizadas, e grandes coreografias. O custo com alimentação, transporte e uma grande equipe de produção são muito altos, e o prêmio não paga todas estas despesas.
Mas a paixão, o status de ficar entre os três primeiros colocados e a aparição na mídia são fatores decisivos para que a brincadeira não pare. Este é o caso de Mossoró, onde anualmente acontece o Festival de Quadrilhas Juninas tradicional e estilizada. Antigamente, as quadrilhas desta cidade eram reuniões onde as pessoas brincavam e montavam coreografias e, às vezes, iam se apresentar no festival que na época era chamado de São João do Povo.
Como passar dos tempos as quadrilhas foram se tornando empresas. Elas se produzem durante um ano todo fazendo festas e cobrando mensalidades para poder trabalhar, além dos patrocínios públicos e privados. Com isto, o Concurso de Quadrilhas Juninas de Mossoró passou a se dividir em várias categorias.

Boanerges Perdigão, coordenador do Concurso de Quadrilhas de Mossoró fala ao Repórter Junino.
O mais importante dos concursos é o Festival Interestadual de Quadrilhas Juninas, que mobiliza quadrilhas de cidades do vários estados nordestinos, com planejamento durante um ano todo, para poderem se apresentar em Mossoró.
É o caso da Companhia de Quadrilha Tradicional Pai Fernandes, da cidade de Governador Dix Sept Rosado, a 36 minutos de Mossoró. O grupo foi fundado em 2000, em homenagem a Pedro Fernandes, um falecido soldado que preparava os alunos para o desfile cívico de 7 de setembro que havia na cidade.
“Achamos melhor colocar o nome de alguém que fez parte da comunidade que muitos adolescentes não conheciam. Então a gente colocou o nome Pai Fernandes”, disse Aldeciano Silva, coreógrafo da companhia. A montagem começa de 3 de março e vai até 1 de junho. Durante esses três meses, são realizados vários eventos para arrecadar fundos por conta da origem humilde do grupo.
Incentivos Financeiros
As dificuldades financeiras não são exclusividade de companhias de pequenas cidades. Grupos como a quadrilha estilizada Cestinha de Flores, de Campina Grande, cidade onde se realiza o Maior São João do Mundo, passa por problemas semelhantes. Algumas diferenças são notórias, como um maior tempo de montagem, com até 7 meses de trabalho suado e o marcador que participa desde os ensaios iniciais. Porém o descaso com o grupo é o mesmo de qualquer outra cidade.“A comunidade do bairro Cruzeiro ajuda muito, com o arraial da rua, Nós temos patrocínio que conseguimos juntar do bairro e tem a prefeitura de Campina Grande, mas ainda é pouco para se fazer uma boa apresentação”, apontou João Robson, coreógrafo da companhia Cestinha de Flores.
Apesar de haver editais de cultura para patrocínios de quadrilhas juninas, pode-se perceber um grande esfacelamento dessa manifestação cultural. A cultura da quadrilha, bem como os outros elementos da cultura nordestina, devem ser valorizados tanto pela mídia local como por políticas públicas, tendo em vista que são eles que preservam a identidade cultural do nosso povo.
Fotos: Anthony Souza e Ênio Marques.
Edição: Anthony Souza.